Homo sapiens 1900
Suécia, 1998. 88 min. Direção, roteiro, produção e montagem: Peter Cohen.
Peter Cohen:
Nasceu em Lund, Suécia, em 1946, filho de um judeu alemão que fugiu de Berlim em 1938. Tornou-se fotógrafo profissional aos 18 anos e estudou na Escola de Cinema de Estocolmo e no Instituto Dramático de Documentários até 1975. Produziu mais de 40 documentários e filmes infantis premiados internacionalmente. Seu Arquitetura da Destruição foi premiado em diferentes mostras e se transformou em cult no Brasil.
O documentário de Peter Cohen é extremamente interessante e revelador das tendências assumidas pelas ciências, de maneira mais geral, pelas sociedades européias, pois arquivos de fotos e filmes utilizados deixam claro o fortalecimento da idéia de que seria possível e desejável a melhoria da raça humana através da ciência desde fins do século XIX até chegar a um ponto extremo com o nazismo e fascismo.
Suécia, 1998. 88 min. Direção, roteiro, produção e montagem: Peter Cohen.
Peter Cohen:
Nasceu em Lund, Suécia, em 1946, filho de um judeu alemão que fugiu de Berlim em 1938. Tornou-se fotógrafo profissional aos 18 anos e estudou na Escola de Cinema de Estocolmo e no Instituto Dramático de Documentários até 1975. Produziu mais de 40 documentários e filmes infantis premiados internacionalmente. Seu Arquitetura da Destruição foi premiado em diferentes mostras e se transformou em cult no Brasil.
O documentário de Peter Cohen é extremamente interessante e revelador das tendências assumidas pelas ciências, de maneira mais geral, pelas sociedades européias, pois arquivos de fotos e filmes utilizados deixam claro o fortalecimento da idéia de que seria possível e desejável a melhoria da raça humana através da ciência desde fins do século XIX até chegar a um ponto extremo com o nazismo e fascismo.
Partindo da teoria darwiniana da evolução das espécies, o inglês Francis Galton seria um dos primeiros a defender a criação de uma ciência que pudesse promover a melhoria da espécie humana aplicando um cruzamento seletivo já aplicado à agrucultura e à pecuária: a eugenia. A vida, a família e a sociedade poderiam ser cultivadas como um jardim em que ervas daninhas devem ser distinguidas de plantas úteis. A eugenia poderia assumir uma forma positiva – idéia disseminada de forma pioneira na Europa do Norte, que consistiria em esforços para incentivar o cruzamento entre seres humanos superiores – e uma forma negativa – evitar a reprodução de seres considerados inferiores e mesmo a eliminação de seres nascidos com defeitos, como defenderam eugenistas mais radicais em diferentes países, como os Estados Unidos e a Alemanha (neste caso, posto nas décadas de 1930 e 40).
Algumas décadas antes de 1900 – o autor toma esta data como título para destacar a força que a idéia de eugenia teria no século que se iniciava – as leis de Gregor Mendel são redescobertas. Porém, o fortalecimento desta teoria dá origem a uma controvérsia entre os lamarckistas (o meio ambiente forma a hereditariedade) e os mendelianos, sendo a adesão a cada uma destas correntes relacionada à dinâmica política e social de cada lugar.
O termo higiene racial inventado pelo médio alemão Alfred Beltz, propondo eliminar bebês com problemas, isto é uma eugenia positiva reforçada por uma purgação. Criar ciência nova e abrangente, a Biologia Racial e Social. A idéia de uma “raça pura” torna-se popular na Alemanha já em torno de 1900.
Na Suécia, em fins do século XIX e início do XX foram levadas a cabo pesquisas sistemáticas em prisões e institutos penais, cidades e paróquias, com atenção às características étnicas e antropológicas. Ali, as políticas e concepções racistas disseminaram-se paralelamente – e muitas vezes, de com alguma associação – ao surgimento de um estado de bem-estar social. Unindo estes elementos aparentemente díspares, a valorização o sangue nórdico – incluindo aí uma suposta origem pura comum aos alemães – persistirá mesmo no pós-guerra – evidente nas campanhas de esterilização em massa que só deixaram de ser vistas como razoáveis nos anos 1970.
Medições, comparações e hierarquizações dos diferentes formatos de crânio e biótipos permitiriam descobrir a raiz genética, hereditária (natural) das desigualdades sociais no interior de cada “nação” européia e em entre a “civilização” européia como um todo e as excêntricas “raças” vindas de lugares cada vez mais desconhecidos e “primitivo” do globo. Nesse sentido, “a biologia era essencial para uma ideologia burguesa teoricamente igualitária, pois deslocava a culpa das evidentes desigualdades humanas para a natureza ... [e serviria para a] concentração e incentivo às estirpes humanas de valor (em geral identificadas à burguesia ou a raças adequadamente coloridas, como a ‘nórdica’.” (Hobsbawn, p.351-352). Este intercâmbio entre eugenia e a nova ciência da “genética” – num quadro geral de diversificação e autonomização das ciências – veio à luz pouco antes de 1900 e continuaria a dar frutos.
Portanto, é evidente a relação deste fortalecimento da idéia de higiene racial – não apenas entre elites, mas também entre proporções consideráveis das “massas” de diferentes países – e o processo de expansão do imperialismo e do colonialismo. Os pavilhões coloniais das grandes exposições e feiras internacionais apresentariam, desde as últimas décadas do século XIX, curiosos e exóticos seres humanos vindos de áreas colonizadas e/ou dominadas por alguma parte da Europa “civilizada”.
Portanto, é evidente a relação deste fortalecimento da idéia de higiene racial – não apenas entre elites, mas também entre proporções consideráveis das “massas” de diferentes países – e o processo de expansão do imperialismo e do colonialismo. Os pavilhões coloniais das grandes exposições e feiras internacionais apresentariam, desde as últimas décadas do século XIX, curiosos e exóticos seres humanos vindos de áreas colonizadas e/ou dominadas por alguma parte da Europa “civilizada”.
Já os Estados Unidos da América, defensores da “democracia liberal na 2ª Guerra Mundial”, foram palco de campanhas racistas contra negros e imigrantes no período. No ano de 1907, mais de 20 estados norte-americanos possuíam leis de esterilização compulsória, que incidiram sobre dezenas de milhares de pessoas. Competições eugênicas, com testes de inteligência e exames médicos de famílias, em que os vencedores recebiam prêmios por portarem “boa herança”. Mesmo Hollywood expôs a crescente aceitação da idéia de higiene racial no filme “The Black Stork” em que um médico convence uma mãe a abandonar seu bebê recém-nascido com defeitos. Só na 2ª Guerra Mundial, em que os soldados americanos combateriam os alemães em duras batalhas, as idéias eugênicas perdem força, por estarem demasiadamente associadas ao nazismo e ao fascismo.
Na Rússia pré-revolucionária, já havia cientistas e intelectuais defensores de alguma forma de eugenia. Mas é na URSS, desde a morte de Lênin, que a preocupação em definir as características do homem socialista perfeito ganha força. Uma biologia socialista (e lamarckista) passa a ter caráter de “dogma”, com a preocupação de definir os comportamentos (ditados pela interpretação dada pelo Estado ao socialismo) que poderiam levar a uma melhoria genética – tendo como contrapartida a proibição de pesquisas genéticas mendelianas, sendo alguns de seus praticantes presos e mesmo fuzilados. O cérebro de Lênin, como mostrado no documentário, seria colocado ao lado de outros homens inteligentes da burocracia e da intelectualidade russa, para deifinir as características do cérebro/intelecto superior.
O principal objetivo (e maior mérito) do trabalho de Peter Cohen parece ser oferecer uma
contrapartida à identificação – recorrente em veículos de comunicação de massa e em documentários – das teorias e práticas científicas racistas exclusivamente com o nazismo e o fascismo de meados do século XX. As concepções extremadas adotadas pelos regimes nacionalistas e totalitários já vinham sendo amadurecidas e experimentadas em diferentes países, como fica evidente pela recorrência de temas da eugenia em discursos e plataformas de liberais, reformadores sociais e alguns setores de esquerda, bem nas idéias de amplos setores das classes médias desde fins do século XIX.
As controvérsias sobre o significado da hereditariedade biológica produzidas no século XIX – e que tiveram como conseqüência o surgimento da ciência genética propriamente dita – um impacto significativo nas idéias políticas e científicas do século XX. Cohen está certo ao apontar que hoje, no início do século XXI, quando experimentamos o declínio de utopias, há um contexto propício para que o ideal de manipulação da vida humana pelas ferramentas biológicas (genética) adquirir nova vida.
BIBLIOGRAFIA DE APOIO:
BIBLIOGRAFIA DE APOIO:
HOBSBAWN, Eric. A Era dos Impérios (1875-1914), 3ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988.
Homo sapiens 19000 – Film Note – Movie Review. American Journal of Economics and Sociology, 10/1/02. Disponível em: http://findarticles.com/p/articles/mi_m0254. Acesso em 24/05/2008.
Homo sapiens 19000 – Film Note – Movie Review. American Journal of Economics and Sociology, 10/1/02. Disponível em: http://findarticles.com/p/articles/mi_m0254. Acesso em 24/05/2008.